O Reino Unido investiu 37 mil milhões de libras num sistema de teste e rastreio – NHS Test and Trace (NHST&T) – mediante a promessa feita pelo Departamento de Saúde e Assistência Social (DHSC) de que este evitaria um segundo lockdown. Mas o sistema não conseguiu responder à promessa e está agora a ser alvo de duras críticas por parte do Comité de Contas Públicas que contestam o avultado investimento realizado.
O sistema foi criado com um orçamento de 22 mil milhões de libras, mas recebeu entretanto mais 15 mil milhões de libras.
O relatório colocou em causa vários pontos:
– A NHST&T publica muitos dados de desempenho, mas estes não demonstram quão eficaz é o programa de teste e o rastreio na redução da transmissão da COVID-19.
No relatório, o Comité diz que não há provas claras da eficácia global da NHST&T, nem de que a sua contribuição para redução dos níveis de infeção – por oposição às outras medidas introduzidas – justifique os custos “inimagináveis“.
“O Departamento de Saúde e Assistência Social justificou a escala deste investimento, em parte, com a implementação de um sistema eficaz de teste e rastreio que ajudaria a evitar um segundo confinamento nacional. Mas desde a sua criação tivemos mais dois lockdowns. Ainda não há provas claras que nos permitam analisar a eficácia global da NHST&T. Não é claro se a sua contribuição para reduzir os níveis de infeção, em oposição às outras medidas introduzidas para combater a pandemia, justificam os custos.”
– NHST&T ainda luta para responder consistentemente à oferta e procura dos seus serviços de teste e rastreio, o que dá origem a um desempenho abaixo dos padrões ou a um excesso de capacidade.
Apesar de a NHST&T ter contactado mais de 2,5 milhões de pessoas com testes positivos Covid-19 em Inglaterra, e ter aconselhado mais de 4,5 milhões de contactos associados a entrarem em isolamento as baixas taxas de utilização – bem abaixo do objetivo de 50% – persistiram até outubro do ano passado. A capacidade total de testes laboratoriais utilizada em novembro e dezembro de 2020 permaneceu abaixo dos 65%, mesmo com uma elevada capacidade disponível.
O relatório do Comité diz ainda que:
No início deste ano a NHST&T manteve-se focada na realização de testes em massa em diferentes contextos comunitários, mas houve problemas na implementação destas políticas nas escolas depois de ter “subestimado significativamente o aumento da procura de testes quando as escolas e universidades regressaram em setembro passado”.
– Apesar da urgência de criar uma estrutura capaz de garantir todos os níveis de serviço necessários, a NHST&T continua a depender excessivamente de consultores e recursos temporários dispendiosos.
“Os 22 mil milhões de libras investidos no teste e rastreio correspondem ao orçamento anual do Departamento de Transportes. O Test and Trace continua a pagar £1000 por dia a consultores”, diz Meg Hillier MP, Presidente do Comité de Contas Públicas.
– A introdução de testes rápidos deveria ser ter sido uma medida decisiva, mas persiste a confusão sobre porquê e como estes deverão ser usados em diferentes contextos comunitários.
Para apoiar a implementação de testes rápidos LFD, o governo atribuiu mais £7 mil milhões à NHST&T em dezembro de 2020, para além dos £3 mil milhões já orçamentados. O Departamento já tinha adquirido 384 milhões de kits de testes LFD. “No entanto, vários relatórios questionam a eficácia e os riscos dos testes em massa que utilizam LFD, dada a sua menor precisão em comparação com os testes processados em laboratório, nomeadamente o maior risco de “falsos negativos.”
De acordo com o Comité, a T&T indicou que “um resultado negativo do teste significa que um indivíduo tem cerca de 77% de probabilidade de ser negativo para a Covid-19”. As orientações iniciais da NHST&T e da Public Health England para as escolas sugeriram que estes testes poderiam ser usados como alternativa ao autoisolamento, mas essa indicação foi entretanto retirada, devido ao aparecimento da nova variante do vírus. Na sequência do anúncio do Primeiro-Ministro a 22 de Fevereiro, as escolas irão testar regularmente os estudantes e os funcionários com testes LFD, mas as orientações sobre estes testes rápidos nas escolas ainda não foram atualizadas.
“O Departamento e a NHST&T devem definir claramente as políticas de utilização destes testes rápidos em massa em cada um dos cenários, definir objetivos claros e avaliar o progresso nos vários sectores. Quaisquer planos devem ter em conta a finalidade aprovada e a precisão dos testes rápidos, bem como devem gerir os riscos associados às falsas garantias que os testes possam fornecer. Se os testes LFD não forem adequados em algumas circunstâncias, a NHST&T deve apresentar urgentemente outros planos para identificar portadores assintomáticos da Covid-19.”
O relatório sublinha que tanto o Departamento como a NHST&T devem aprender com estes erros e repensar a definição de como os testes rápidos podem ser utilizados.
“A DHSC e o NHST&T devem começar a demonstrar valor que justifique o impressionante investimento feito com dinheiro dos contribuintes. Não só é essencial que assegure um sistema eficaz à medida que os alunos regressam à escola e as pessoas aos locais de trabalho, mas também que nos mostre um sistema de topo tendo em conta os milhares de milhões que foram gastos. Os contribuintes britânicos não podem ser tratados pelo Governo como uma máquina ATM. Precisamos de ver um plano claro e custos mais controlados“, disse Meg Hillier.
Esta foi a primeira avaliação feita pelo Comité à NHST&T e ao seu desempenho, mas a organização já deixou o aviso que irá acompanhar de perto o progresso do programa de teste e rastreio e que uma nova análise será feita no final do ano.