Portugal é o único país da Europa Ocidental que apresenta uma queda em três parâmetros de avaliação, no Relatório Global sobre o Estado da Democracia do IDEA. E, pelo quinto ano consecutivo, o número de países que se movem numa direção autoritária excede o número de países que se movem numa direção democrática.
No relatório do Instituto Internacional para a Democracia e Assistência Social (IDEA) sobre o estado da democracia, Portugal regista uma queda em três dos parâmetros em avaliação, que analisam a qualidade das democracias – a independência judicial, a ausência de corrupção e a igualdade perante a lei.
Portugal é o único país da Europa Ocidental a registar uma queda tão acentuada.
Fonte da imagem: The Global State of Democracy Indices
A independência judicial é extremamente importante porque garante a igualdade dos cidadãos perante a lei. Quando vários grupos de cidadãos não têm direitos legais iguais aos outros, cria-se uma diferenciação que impede o desenvolvimento económico sustentado.
Em Portugal, casos recentes podem colocar em questão estes três parâmetros judiciais.
Por exemplo, o caso de Ihor Homeniuk (cidadão ucraniano), quando a procuradora responsável permitiu que o cadáver fosse removido do local onde poderiam ter sido recolhidas provas, mesmo tendo sido informada que o corpo estava, nas suas palavras, “um bocado maltratado”.
A mesma procuradora arquivou o caso da morte misteriosa de Danijoy Pontes (cidadão são-tomense), de 23 anos, no Estabelecimento Prisional de Lisboa. A família reclamava por respostas à sua morte e por não poder ver o corpo. O caso foi reaberto pela ministra da Justiça e o processo foi entregue à mesma procuradora. Os serviços prisionais garantem que o jovem morreu naquela cadeia em setembro por “causas naturais”.
O mundo está mais autoritário
No relatório é constatado que o mundo está a tornar-se mais autoritário à medida que os regimes não democráticos se tornam ainda mais descarados na sua repressão e muitos governos democráticos sofrem de recuos ao adotarem as suas táticas de restrição da liberdade de expressão e de enfraquecimento do Estado de direito exacerbados pelo que ameaça tornar-se uma “nova normal” das restrições Covid-19.
Pelo quinto ano consecutivo, o número de países que se movem numa direção autoritária excede o número de países que se movem numa direção democrática. De facto, o número que avança na direção do autoritarismo é três vezes superior ao número que avança na direção da democracia.
Seis pontos destacados no relatório
- O número de países que avançaram numa direção autoritária em 2020 superou o número dos que avançaram numa direção democrática. A pandemia prolongou esta tendência negativa existente numa extensão de cinco anos, o período mais longo desde o início da terceira onda de democratização na década de 1970.
- Alguns dos exemplos mais preocupantes de recuos são encontrados em alguns dos maiores países do mundo (Brasil, Índia). Os Estados Unidos e três membros da União Europeia (UE) (Hungria, Polónia e Eslovénia, que ocupa a presidência da UE em 2021) também assistiram a declínios democráticos.
- A integridade eleitoral é cada vez mais questionada, muitas vezes sem provas, mesmo nas democracias estabelecidas. As alegações infundadas do ex-Presidente dos EUA Donald Trump durante as eleições presidenciais americanas de 2020 tiveram efeitos colaterais, incluindo no Brasil, México, Mianmar e Peru, entre outros.
- Governos democraticamente eleitos, incluindo democracias estabelecidas, estão a adotar cada vez mais táticas autoritárias. Este recuo democrático tem gozado frequentemente de um apoio popular significativo.
- O autoritarismo está a aprofundar-se em regimes não-democráticos (regimes híbridos e autoritários). O ano 2020 foi o pior de sempre, em termos do número de países afetados pelo aprofundamento da “autocratização” (1)*. A pandemia teve assim um efeito particularmente prejudicial em países não democráticos, fechando ainda mais o seu já reduzido espaço cívico.
- A distribuição desigual das vacinas Covid-19, em todo o mundo, bem como opiniões anti vacinas minam a adoção de programas de vacinação e arriscam em prolongar a crise sanitária e normalizar restrições às liberdades básicas.
*Nota: no relatório não constam dados que fundamentam este ponto
Alicerces do relatório
O documento analisa o estado da democracia em todo o mundo no curso de 2020 e 2021. Baseia-se na análise de eventos que tiveram impacto na governação democrática a nível mundial desde o início da pandemia. Tendo em conta, cinco atributos principais que definem a democracia: Governo representativo, Direitos Fundamentais, Controlos do Governo, Imparcial Administração e Participação. Estes cinco atributos fornecem a estrutura organizativa para este relatório.
(1)* Não participação política dos cidadãos