Jornais de referência divulgaram notícia falsa sobre a eficácia de máscaras, baseados num estudo da BMJ. Os títulos falam de uma diminuição substancial de “incidência Covid”, mas editores da revista científica desmentem essa conclusão e dizem tratar-se de evidência com qualidade “baixa ou muito baixa”.
Um artigo intitulado “Eficácia das medidas de saúde pública na redução da incidência da Covid-19, da transmissão SARS-CoV-2 e da mortalidade Covid-19: revisão sistemática e meta-análise” serviu de mote para que vários órgãos de comunicação social reproduzissem a notícia de que as máscaras “reduzem a incidência Covid em 53%”.
O estudo publicado pela BMJ tem diversas lacunas e deficiências, que levam a que os próprios autores reconheçam terem tido dificuldade em estabelecer “uma conclusão direcional ou causal”.
A meta-análise de onde é retirado o valor médio de 53% inclui apenas seis estudos e apenas um RCT (estudo controlado e randomizado). Os restantes são de qualidade inferior (nenhum com risco de viés baixo).
Curiosamente, as conclusões dos autores desse RCT, realizado com máscaras de alta qualidade e com os participantes devidamente instruídos, foram:
“Os nossos resultados sugerem que a recomendação de usar uma máscara cirúrgica quando fora de casa, entre outros, não reduziu, a níveis convencionais de importância estatística, a incidência de infeção SARS-CoV-2 em utilizadores de máscaras num ambiente em que o distanciamento social e outras medidas de saúde pública estavam em vigor, as recomendações de máscara não estavam entre essas medidas, e o uso comunitário de máscaras era incomum.”
Esclarecimento dos editores
Num editorial sobre a publicação intitulado “A falta de boa investigação é uma tragédia pandémica”, é salientado:
“Os efeitos observados nos estudos observacionais do uso de máscaras serão indistinguíveis de outros comportamentos de proteção não contabilizados durante o ajuste, …”
“ … a qualidade da evidência atual seria classificada – por critérios de GRADE – baixa ou muito baixa, uma vez que consiste principalmente em estudos observacionais com métodos deficientes (enviesamentos na medição dos resultados, classificação de PHSM e dados em falta) e alta heterogeneidade do tamanho do efeito. São necessárias mais e melhores investigações.”
Fact-checking
O Fullfact, um fack-checker financiado em parte pelo Facebook, debruçou-se sobre o tema.
Referiu-se concretamente ao The Guardian, ao New Scientist e à Forbes, e confirmou terem usado um título falso.
Nota: O link da notícia divulgada pelo New Scientist deixou de estar online, sem qualquer justificação
Em Portugal, a notícia também foi publicada pelo jornal Publico, com o seguinte título – “Máscara reduz incidência em 53% e pode voltar a ser obrigatória em Portugal”.
Mecanismos anti desinformação
Ao que conseguimos apurar até ao momento, não foi feita qualquer notificação, ou censura, a quem transmite esta informação falsa. Ela continua a ser difundida livremente em meios de comunicação, em redes sociais e em pesquisas na internet.