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Para qualquer pessoa íntima do direito, há quatro ou cinco “chavões” que caraterizam um Estado de Direito Democrático: Soberania Popular, Representatividade, Direitos, Liberdades e Garantias, Legalidade e Separação de Poderes. Todos eles protegidos pela magna Lei Fundamental, a Constituição da República Portuguesa (CRP) e resguardados nela como joia da sua coroa.

O uso político da famigerada pandemia veio comprometer a integridade destes pilares, com arbitrariedade, violações desproporcionais ao princípio da liberdade e da autodeterminação, ataques à liberdade de expressão e outras violações constitucionais de vária ordem.

A “elite esclarecida” que nos governa (no país e no mundo) aproveitou as prerrogativas de autoridade das quais dispõe, para fazer uma tempestade num copo de água, levando pela frente na enxurrada as liberdades individuais, a autodeterminação dos cidadãos, a legalidade democrática e o que mais haja que se atravesse no caminho do obstinado controlo social.

O estandarte é a doença e ela serve de propaganda política ao reforço da intervenção do Estado. Cada vez mais centralizador e despótico. Sem limites ao seu poder.

Com o (poderoso) argumento do direito à saúde e à vida defendem a supressão de diversos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos. Seria de ponderar se, no caso, não passassem de retórica. É que tanto quanto me consta o direito à saúde nunca esteve em causa em países e estados federais (por exemplo, Suécia e Florida)  que optaram por abordagens menos restritivas ao controlo da pandemia, não tendo os Hospitais registado demanda que levasse à saturação das UCI’s. Mesmo em Portugal foram montados e desmantelados Hospitais de campanha sem nunca terem tido uso…

Também não se pode dizer com seriedade que esteja em causa o direito à vida com taxas de letalidade real (infetados) da Covid a rondar os 0,23% (estudo publicado no site da OMS).

Se assim fosse também a gripe, rica em estirpes mutantes, a tuberculose, o VIH ou outras quaisquer doenças infecto-contagiosas teriam justificado as mesmas medidas.

Esta é uma pandemia sobretudo política, com a virtuosidade de nos vir tirar (a alguns) o véu da ilusão. É que quem achar que no contrato social em vigor o Estado ainda garante segurança, faz justiça, promove a paz, bem-estar social e físico e o progresso dos seus cidadãos está retumbantemente equivocado.

Por estes tempos quem (ainda) acreditava nisso ou já se desenganou ou vai sentir-se enganado a curto-prazo.

Se dúvidas restassem… podia referir a falta de investimento no Serviço Nacional de Saúde (SNS) durante décadas. Foram décadas a “enjeitar” a saúde. Sem meios, sem médicos, sem enfermeiros, sem condições condignas, sem camas, sem material, sem planeamento… 

Agora a pandemia colocou a descoberto as fragilidades que se iam varrendo para baixo do tapete e deixou a todos claro que o SNS não tem capacidade para aguentar nem mais uma grama de pressão sobre si (seja por via de uma pandemia ou seja lá pelo que for).

Se dúvidas restassem…podia mencionar a subserviência do poder político aos lobbies económicos e corporativos, que ficou agora perfeitamente visível, com a indústria farmacêutica e laboratorial a lucrar milhares de milhões de euros em apenas dois anos. Esses mesmos dois anos não foram suficientes para minorar as carências da saúde, fosse dotando os Hospitais de mais meios, fosse para redistribuir o capital humano pelos serviços de saúde, de forma a garantir o diagnóstico atempado de outras doenças (que também matam).

Se dúvidas restassem… também podia falar sobre a permeabilidade do poder judicial ao poder executivo (Governo) e ficávamos sem dúvidas.

Para trás já tínhamos uma coleção de episódios de justiça impura: de Sócrates a Salgados, de tudo já se viu na classe da magistratura no que toca a servir interesses alheios ao ideal de justiça.

O que revela a pandemia a este nível? Mais do mesmo. Um sistema judicial que dá guarida às distopias políticas em vez de defender os direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos.

Numa fase inicial, aqui e ali, juízes e juízas foram afirmando que as restrições ditadas pelo Governo no âmbito da pandemia eram inconstitucionais de vários modos. Há-os por aí, deferimentos de Habeas Corpus, que me fizeram acreditar que seria o poder judicial a salvar-nos da selvajaria ajurídica que atravessamos e a ser o reduto das nossas liberdades (afinal a função jurisdicional foi concebida para administrar a justiça em nome do povo…)

Mas não… Lembrei-me entretanto que o poder político se ostenta nas mais diversas funções do Estado e que o poder do juiz, por mais que se queira, não é um poder neutro porque não ignora a carga política dos atos do poder político.

É certo que se diz que os magistrados são autónomos e independentes… mas a magistratura tem hierarquias e está sujeita a um órgão do Estado – o Conselho Superior de Magistratura – a quem cabe nomear, colocar, transferir e promover juízes, “zelando” pela salvaguarda institucional da classe.

Portanto, são independentes mas não tanto assim… É um facto já sobejamente demonstrado que  magistratura em Portugal sofre pressões do poder político (mormente do executivo); não raras vezes as mais altas esferas de um e de outro privam entre as mesmas paredes e pertencem aos mesmos partidos, às mesmas organizações fraternas, servindo-se descaradamente uns aos outros, num jogo de pactos e favores de irmandade, absolutamente alheios aos interesses inerentes às funções do Estado que desempenham.

Portanto, já ninguém estranha que Sócrates ande à solta depois de ter esbulhado milhões, como ninguém estranha que os cidadãos permaneçam presos em casa por determinação de um Delegado de Saúde, sem poderes para tal restrição de liberdade. Pior que isto só dizer que é com o “amém” dos Tribunais.

Ninguém estranha porque não é estapafúrdio afirmar que não existe real e efetiva separação de poderes em Portugal.

Só assim se explica o repentino volte face de inúmeros Juízes de Instrução por esse país fora que deixaram de dar guarida legal aos pedidos de Habeas Corpus dos cidadãos privados do seu mais natural direito à liberdade.

Então, não se estranha agora que os juízes tenham deixado de considerar detenção, nos termos e para os efeitos do art. 31º da CRP, os isolamentos profiláticos determinados por uma entidade meramente administrativa (os delegados de saúde) e afirmem que o acatamento dessa decisão administrativa (o isolamento) é voluntário, mas que o seu incumprimento tem consequências penais (Crime de Desobediência).

Ou seja, neste estado de coisas não se estranha que haja jurisprudência que considere de cumprimento voluntário um ato que está sujeito a medidas de execução coerciva!!!

É a mesma coisa que dizer que sim, só que não! Ou dizer que é preto, mas branco! Que se pode fazer, mas que é proibido!

É o domínio da semântica sobre a razão, do formal sobre a substância.

Há esta atitude de “malabarismo” criativo, mas pouco sustentado quer no Direito, quer na Ciência (saúde), que nos devia a todos deixar desconfortáveis e cada vez mais irredutíveis na defesa dos nossos direitos e liberdades.

As decisões desta pseudo-elite que nos dirige (??) são ajurídicas e incientíficas, forjadas em ideias inferiores de sobrevivência do seu próprio poder e sempre em tom de “encostar à parede”, com sabor a “vale-tudo”.

Mas já nada é de estranhar, não é? O que antes era desvio ocasional passou a ser sistema permanente. Estamos de joelhos.

Vamos aceitando tudo, como o sapo na panela com água, que sem perceber que a temperatura vai aumentando, acaba por morrer cozido.

Assim estamos a ser cozinhados entre os interesses políticos, o temor social, a confusão (a)jurídica e a paranoia sanitária…

Se eu fosse ingénua e não tivesse diversas vezes sentido perto o cheiro pérfido do poder político por força de funções que desempenhei, dir-vos-ia hoje que tudo isto é inócuo, que tudo o que está a ser feito é para o “bem colectivo” e em nome do “interesse público” mas não…O sistema político está montado para se servir a si mesmo e quem ocupa os assentos do poder fá-lo hoje unicamente motivado pelos seus próprios interesses e necessidades, sem se coibir de mentir, manobrar palavras e números, violar leis ou exercer pressões aqui e ali.

Aqueles que depois disto ainda acreditam na pureza do contrato social e que o Estado é um bonus pater familias, ainda vivem na casa dos pais a achar inocentemente que esse é o melhor sítio do mundo.

O Estado está tomado no seu topo por pessoas que não se interessam com a nossa saúde, nem com a Lei, nem com “bem comum”… nem com nada que não  dê vantagens, poder (e mais poder) e dinheiro.

Lamento, mas tornou-se tão óbvio… Não sou eu, A, B ou C que o dizemos, é a realidade.

É a realidade quando, decorridos 2(dois) anos, continuam a morrer pessoas por falta de diagnóstico de cancro, por falta de acompanhamento médico e consultas ambulatórias no SNS.

É a realidade quando a campanha de vacinação se faz à revelia do consenso científico e baseada em relatórios de “especialistas”, que não possuem uma linha de sustentação científica, mas que, destarte, são adotados pela administração de saúde para alavancar uma vacinação em massa de crianças com idade entre os 5 anos e os 12 anos (sendo as mortes nestas faixas etárias inexistentes).

É a realidade quando os estudos-base, os relatórios preliminares passam a ser “documentos internos”, sonegados ao conhecimento público e em violação ao dever de transparência que quem nos administra está adstrito.

É a realidade quando os Tribunais e os Juízes passam a verter decisões opacas, de meio-termo, que não aquecem nem arrefecem, que não respeitam a função garantística da Constituição, que se revelam propositadamente incapazes de reprimir a violação da legalidade democrática. 

Quando um Estado se afirma prepotente e arbitrário, empregando um esforço centralizador e aglomerante que não admite resistência nem pelo Direito nem pela Ciência, sabemos que é tempo de questionarmos para onde está a ir a nossa visão de sociedade de indivíduos livres e iguais.

Depois disto, se ainda acreditas que tens que sacrificar os teus mais básicos e fundamentais direitos em troca de uma putativa segurança, de uma putativa saúde e de uma putativa vida, acho melhor rogares a Deus, porque por este andar não só não haverá Medicina que te valha como não haverá Lei que te proteja contra os abusos do poder, quando quiseres ser Livre de novo.

 “Não há sujeição tão perfeita como aquela que conserva  a aparência da liberdade; dessa forma, cativa-se a própria vontade.”

J.J  ROUSSEAU

Maura Fonseca

Jurista

23.12.21

Leia também o artigo “A Era do retrocesso democrático”

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