Há dias alguém escreveu isto num grupo privado a que pertenço: “Israel é eterno”. Quando chegamos a este nível de desnorte, vindo de pessoas com responsabilidades e que são ouvidas, algo vai mesmo mal neste mundo louco.
O extremar de posições entre beligerantes e blocos é inaudito, acicatado pelos arautos das partes que explodem nos comentários sentadinhos no conforto dos seus sofás, sem nunca meterem os pés na frente de batalha.
Esta guerra (porque já é disso que se trata), de consequências imprevisíveis e de mortalidade exponencial, é gizada nos corredores silenciosos do poder, nos restaurantes de luxo das grandes capitais, entre pratos de autor, whiskies ou cognacs vetustos e charutos que alimentariam aldeias.
Se fossem os filhos e os netos destes génios a morrer, provavelmente o discurso seria substancialmente diferente. Assim, são apenas mais uns pobres diabos que morrem. Mas não, estes caricatos e empolados arrogantes, velhos de ideias talvez mais do que de idade, não entendem que não podemos continuar a proscrever os pobres de comida, os famintos de dignidade, os amputados da história.
Não existem aqui nem aldeias olímpicas, como em 1972, nem câmaras de gás, como nos anos 30 e 40 do século passado. O que existe aqui é o puro desprezo por outros homens, iguais a nós, porque não comungam das nossas ideias, não fazem parte da nossa tribo ou nem se defendem das nossas sistemáticas e continuadas agressões.
O “direito à sobrevivência”, uma nova vertente do direito internacional para os poderosos que gostam de reescrever a história, não existe para rohingyas, sírios, berberes, haitianos, etíopes, somalis, iemenitas, birmaneses, caxemires, palestinianos, congoleses, aswadi e outros. Mas para ucranianos e israelitas (preferencialmente lourinhos e arianos), aí sim, temos vibrantes o “direito à sobrevivência” e o “direito à autodefesa”.
Crápulas hipócritas, é o que somos todos nós, que tratamos irmãos como os mais desprezíveis seres vivos, apenas para alimentar a nossa gula de poder.
Como se conseguem olhar no espelho? Como é possível que tudo seja resolvido pelo poder das armas, pela estatística das mortes, e que ainda alguém possa assumir toda esta vergonha como uma vitória? Metamos esses Bidens, Putins, Xis, Nethanyaus, Stoltenbergs e afins, todos num campo de batalha e, aí sim, fogo à vontade.
Não confundamos esta canalha com o sentimento de cada povo, puro ou genuíno, seja ele ou não o “escolhido”. Enquanto tivermos estes abutres atraídos pelo cheiro a morte, nos gabinetes, nas televisões ou nos jornais, este será o nosso destino, mas também o nosso fim.
José Alberto Pereira
PhD, Wagner Watch Project, Observatório de Segurança & Defesa SEDES Professor Universitário