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Felizmente, com a crise da covid-19, começou a falar-se cada vez mais das diversas formas como os povos europeus são “envenenados”: através dos produtos alimentares industrializados, das substâncias farmacêuticas, do ar, e até de conteúdos informativos. Porém, creio que ainda se fala pouco da forma como somos ‘intoxicados’ com “música” que – não há outra forma de o pôr – é um autêntico lixo sonoro. A verdade é que o poder do som, para o bem e para o mal, tem sido esquecido e subestimado. E a verdade é que tem um poder enorme. A música de qualidade pode revigorar-nos, como um bálsamo curador; a de má qualidade é uma toxina. 

Portanto, é um erro crasso deixar de fora da nossa lista de “substâncias a desintoxicar” o esgoto musical com que somos inundados todos os dias. Está na altura de levar a sério o facto de a oferta musical actual, longe de inofensiva, ser um veneno para a nossa mente, corpo, e, para quem nele acredite, espírito.  

A música clássica é uma das provas do poder do som no ser humano, e do seu potencial terapêutico, em linha com o “Efeito Mozart”, já estudado cientificamente. Vários estudos clínicos sugerem que ouvir Mozart tem um impacte positivo no nosso cérebro e no bem-estar geral, melhorando o raciocínio espaço-temporal, aliviando problemas como ansiedade e depressão, e até registando benefícios para a epilepsia ou para a pressão arterial. Além disso, embora não tenha sido comprovado, é também possível que possa ser benéfico para o desenvolvimento da inteligência, logo a partir de uma tenra idade. 

E as evidências deste poder incrível não terminam aqui. Nos Estados Unidos, desde os anos 1980 que várias lojas, e até autoridades policias, começaram a tocar música clássica (como Mozart e Beethoven) em alto volume para afastar delinquentes e impedir furtos ou outras actividades criminosas (dentro dos estabelecimentos e fora, nos parques de estacionamento). Também já tem sido estudada a forma como a música dentro de espaços comerciais pode afectar a nossa predisposição para comprar, ou não, determinados artigos. 

Desengane-se, por isso, quem pensa que esta é uma questão de somenos, ou coisa pouca.

Embora tenhamos liberdade para escolher aquilo que ouvimos, quase não haverá alma (a menos que seja um eremita isolado do mundo) que consiga escapar ao ‘lixo’ que se ouve diariamente nas rádios, nas peças publicitárias, nas lojas. E mesmo que alguém consiga, devemos importar-nos com o modo como esta ‘toxina’ é impingida à sociedade, da mesma forma que nos importamos com a ampla disponibilidade de produtos alimentares, farmacêuticos ou informativos prejudiciais. Pois, tal como aqueles venenos não deviam ser de acesso tão fácil, também a degeneração musical não deveria ser normalizada. E se aquelas indústrias fazem fortunas à custa da nossa saúde mental, física e emocional, a indústria musical não é diferente. 

O rap degradante e cheio de vulgaridades, o ‘funk’ brasileiro repulsivo, as músicas lamechas para ‘totós’, o pop de pacotilha – nada disto deveria ser tão difundido e promovido como é hoje. Mas não é por acaso que o é; nem com boas intenções. 

A isto, acresce o facto de serem as crianças e os jovens quem está mais vulnerável a esta ‘intoxicação’ por via sonora. E a música que lhes entra pelos ouvidos, inevitavelmente moldará os seus pensamentos, comportamentos e, deste modo, as suas vidas; talvez, durante muito tempo. Decerto, todos nos lembramos de termos sido profundamente impactados e até ‘transformados’ por uma qualquer moda musical.  

Mas, infelizmente, apesar de os adolescentes serem os alvos mais fáceis e apetecíveis para a indústria musical, também muitos millenials têm aderido aos ‘êxitos’ que se reproduzem ad nauseaum em incontáveis espaços, desde as redes sociais às rádios e discotecas. 

Aqueles que estejam conscientes deste mal, têm, assim, a seguinte incumbência: ouvir boa música e consciencializar os demais para os malefícios das abomináveis “músicas” que tanto se faz(em) ouvir. 

Fontes: 

The Mozart effect – PMC 

Tacoma stores face neighborhood backlash after use of loud classical music to deter crime 

Why 7-Eleven plays classical music outside its stores – The Hustle

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