Pfizergate: “Restará muito pouca transparência quando von der Leyen terminar (o mandato)”

Ursula von der Leyen

A jurista finlandesa Päivi Leino-Sandberg, que já venceu processos contra o Parlamento e o Conselho europeu, não poupou críticas à Comissão Europeia numa entrevista sobre o caso “Pfizergate”  que volta aos tribunais já na próxima semana. Leino-Sandberg acusa a Comissão de querer esconder informações que deveriam ser públicas, com a recusa de Ursula von der Leyen em divulgar as mensagens trocadas com o CEO da Pfizer para a aquisição de 1,8 mil milhões de vacinas covid. E apela a um “clamor público”, avisando que, caso contrário, não haverá réstia de “transparência” na Comissão quando o mandato de von der Leyen chegar ao fim. 

Na próxima semana, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, começará a ser julgada no âmbito do caso “Pfizergate”. Em causa no processo está a compra de 1,8 mil milhões de doses de vacinas contra a covid-19, negociadas através de chamadas e mensagens de texto, com o CEO da Pfizer, Albert Bourla.  

O New York Times noticiou o caso em 2021, tendo posteriormente movido uma acção legal contra a Comissão Europeia, após a sua recusa em divulgar o conteúdo das mensagens. 

A Comissão von der Leyen, que poderá ter mesmo eliminado as comunicações, negou aos tribunais o acesso às mensagens e justificou-se alegando que eram de “curta duração” e que não estariam abrangidas pelas normas legais europeias para a transparência.  

No entanto, ao jornal de investigação Follow The Money, a jurista finlandesa Päivi Leino-Sandberg, que no passado levou o Parlamento e o Conselho Europeu ao banco dos réus, contesta a tese da Comissão Europeia e defende que este processo é sobre muito mais do que uma troca de mensagens.  

“A Comissão quer certificar-se de que pode realizar todas as suas discussões a nível interno e controlar a publicidade, escolhendo quais e quando pretende torná-las públicas. A Comissão parece ter um entendimento peculiar do que é a liberdade de informação – este deveria ser o direito dos cidadãos de saberem como estão a ser governados e de terem acesso à informação que lhes interessa”, considerou. 

A esta questão sobre se a Comissão Europeia pode rejeitar pedidos de acesso à informação com base numa alegada irrelevância das mensagens, 15 juízes do Tribunal de Justiça da União Europeia (UE), sediado no Luxemburgo, deverão dar resposta na próxima quarta-feira, dia 14.   

E, para Leino-Sandberg, a resposta deveria ser negativa: 

“Nenhum detentor de poder numa sociedade democrática pode, de facto, presumir que pode gerir todos os seus negócios em segredo. Mas é basicamente isso que a Comissão está a tentar fazer”, afirmou. 

Questionada sobre o porquê destes ‘entraves’ à transparência pela Comissão, a jurista respondeu que “eles não veem nenhuma razão para tornar as suas vidas mais difíceis permitindo o debate público e o escrutínio das suas acções”. 

Para Leino-Sandberg, também não faz sentido o argumento da defesa de Ursula von der Leyen de que as suas mensagens não pertencem ao organismo a que preside. “A ideia de que a presidente da Comissão está separada da Comissão como instituição soa realmente absurda, dado que as mensagens dizem respeito ao trabalho de von der Leyen como presidente.” 

A jurista lança críticas directas a von der Leyen, dizendo que a presidente da Comissão já demonstrou não ser “fã da transparência” no seu primeiro mandato, e apelou a uma maior exigência por parte dos europeus para pôr termo à opacidade.  

“Tem de haver uma reação pública mais forte e uma responsabilização da Comissão pela sua falta de respeito pelo direito dos cidadãos à informação.  Não é uma escolha discricionária das instituições se elas são transparentes ou não. Trata-se de uma obrigação decorrente do Tratado e da Carta que a Comissão tem de cumprir. Não está acima da lei.  Precisamos de um clamor público, pois olhando para a determinação com que a Comissão von der Leyen desmantela a transparência da UE, restará muito pouca quando ela terminar [o mandato]”. 

Fontes 

Pfizergate case: ‘There will be very little transparency left once von der Leyen is done’ – Follow the Money – Platform for investigative journalism

Ver também 

Provedora de Justiça da UE: poderosos “Consiglieris” dirigem a Comissão de von der Leyen – The Blind Spot 

Pfizergate: Procuradores europeus investigam alegadas irregularidades criminais de von der Leyen – The Blind Spot 

Usurpação de poderes de von der Leyen motiva descontentamento interno na UE – The Blind Spot 

Comissão Europeia acusada de proteger von der Leyen do escrutínio público – The Blind Spot 

A falta de transparência de von der Leyen – The Blind Spot