Uma fake-news publicada por jornais de referência internacionais, como o The Guardian, foi disseminada por jornais de referência nacionais.
A notícia foi divulgada em diversos meios de comunicação com títulos semelhantes, como – “Uso de máscara reduz em 53% incidência de covid-19, conclui estudo”.
O título é contrariado pelos autores e pelos editores do British Medical Journal (BMJ), jornal onde foi publicado o estudo, que apresentam várias objeções a essa conclusão.
Entre outras limitações apontadas, os editores salientaram:
“ … a qualidade da evidência atual seria classificada – por critérios de GRADE – baixa ou muito baixa, uma vez que consiste principalmente em estudos observacionais com métodos deficientes (enviesamentos na medição dos resultados, classificação de PHSM e dados em falta) e alta heterogeneidade do tamanho do efeito. São necessárias mais e melhores investigações.”
Esta revisão considerou apenas seis estudos na sua meta-análise. Curiosamente, o único RCT (estudo randomizado e controlado), portanto com elevada qualidade de evidência, não conseguiu detetar diferenças estatisticamente relevantes entre os “utilizadores” e os “não utilizadores” de máscaras.
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Um dos fact-checkers, entidades que raramente abordam notícias divulgadas pelos media mainstream, desmentiu a notícia.
Difusão de título falso
Apesar de tudo, o título foi partilhado por alguns dos principais órgãos de comunicação social em Portugal.
O PUBLICO refere, no subtítulo, que a meta-análise incluí 30 estudos, quando na realidade apenas inclui seis para as máscaras (oito no total).
Ainda se referindo aos estudos, no corpo da notícia, o jornal menciona não os 30 estudos que estão destacados no subtítulo, mas sim “mais de 30”.
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Informação falsa além do título
Vários órgãos de comunicação, no corpo da notícia, reproduzem de forma literal a informação da agência Lusa.
“Segundo este trabalho, que rastreou milhares de estudos e agregou algumas dezenas mediante o cumprimento de determinados critérios de observação para um escrutínio mais apurado, o efeito do uso de máscara traduziu-se numa redução de 53% na incidência de covid-19 (a partir de estudos com um total de 2.627 pessoas com covid-19 e 389.228 participantes).
Simultaneamente, um estudo empírico em 200 países refletiu 45,7% menos mortalidade relacionada com a covid-19 em países onde o uso de máscara era obrigatório e um outro estudo empírico realizado nos Estados Unidos observou uma redução de 29% na transmissão do vírus em estados onde foi decretada a obrigatoriedade de uso de máscara.”
Deste modo, através desta notícia é difundida a mensagem de que “o efeito do uso de máscara traduziu-se numa redução de 53% na incidência de covid-19”, sem referência alguma às principais limitações apontadas pelos editores do BMJ e pelos autores do estudo.
Além disso, existe outra informação incorreta. Num parágrafo após a menção do estudo recentemente publicado, são referidos outros dois estudos observacionais baseados em modelos matemáticos, como tendo sido apresentados em “simultâneo”.
Acontece que esses estudos não foram publicados em simultâneo. O primeiro é um estudo com mais de um ano. O segundo foi publicado há cerca de seis meses e, entre as limitações reconhecidas pelos autores, está a não consideração de fatores como a sazonalidade.
Ambos são estudos de baixo nível de evidência.
Outros jornais optaram por reproduzir exatamente o mesmo título da agência de notícias portuguesa.
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