Excluindo a integração e a assimilação, porque inviĆ”veis em termos efectivos, restava, pois, Ā como opção Ćŗnica – o multiculturalsmo -, mas aqui as dificuldades eram mais que muitas, atento o nĆŗmero dos recĆ©m-chegados, a marginalização com a criação (natural) de bairros próprios ou guetos, a preservação de valores comportamentais Ć©tnicos em constante choque sócio-cultural com os das sociedades de acolhimento e, finalmente, a formação do que podemos designar por ā€œsociedades mosaicosā€, que encorajavam a exclusĆ£o e nĆ£o a inclusĆ£o.

A opção pelo multiculturalismo foi, em termos genĆ©ricos, seguida – e ainda hoje o Ć© por um bom nĆŗmero de paĆ­ses – todavia, em marƧo de 2011, sem prejuĆ­zo das opiniƵes de alguns peritos em contrĆ”rio, o entĆ£o PM britĆ¢nico, David Cameron considerou que as minorias estavam de alguma forma segregadas em relação Ć  cultura dominante e considerou enfaticamente que o multiculturalismo falhou em toda a linha.

Seguiu-se-lhe Angela Merkel que alegou que ā€œo multiculturalismo era uma farsaā€ e que a integração – em sua opiniĆ£o, a Ćŗnica via a ser seguida – era exactamente o oposto do multiculturalismo.

Quatro anos mais tarde, perante as pressƵes enormes de refugiados e imigrantes, Merkel dĆ” um golpe de rins e declara, sem que ninguĆ©m suspeitasse de que o iria fazer (Generosidade alemĆ£? Complexos de culpa? Outras razƵes?), no seu jĆ” famigerado discurso de 31 de agosto de 2015. Wir schaffen das! (ā€œNós podemos fazĆŖ-loā€, i. e., podemos receber muitos mais imigrantes e integrĆ”-los). A Alemanha desde entĆ£o recebeu, atĆ© atingir um ponto crĆ­tico, cerca de 1,5 milhƵes de imigrantes.

Por conseguinte, excluindo-se, com alguma ambiguidade a via do multiculturalismo, a opção recairia inevitavelmente na integração (por conseguinte, revertĆ­amos Ć  opção anterior). Todavia, nesta matĆ©ria cada paĆ­s pretendeu resolver o problema Ć  sua maneira e nĆ£o de forma concertada. Terminamos, assim, em polĆ­ticas heterogĆ©neas em que, sob a capa da integração, se admite o multiculturalismo (ou alguns dos seus aspectos, desde que nĆ£o vĆ£o ferir a legislação e as tradiƧƵes culturais locais – um exercĆ­cio complexo de execução quase impossĆ­vel) ou, entĆ£o, sob o rótulo do multiculturalismo encaram-se formas diversas de integração, a maioria pĆ­fias e de viabilidade duvidosa.

Todavia, desde hÔ muito que as advertências aos problemas e riscos do multiculturalismo eram claras e provinham de vÔrios sectores, entre outras do economista e intelectual negro norte-americano Thomas Sowell, que se mostrou sempre particularmente crítico e céptico destas políticas:

ā€œO multiculturalismo, tal como o sistema de castas, coloca as pessoas no canto onde nasceram. Mas, pelo menos, o sistema de castas nĆ£o pretende beneficiar os que estĆ£o em baixo. … O multiculturalismo nĆ£o serve apenas os interesses egoĆ­stas dos intelectuais, serve tambĆ©m os interesses polĆ­ticos dos funcionĆ”rios eleitos, que tĆŖm todo o incentivo em promover um sentimento de vitimização, e mesmo de paranóia, entre os grupos cujos votos desejam, em troca de apoio material e psĆ­quico. Para rematar logicamente, perante os argumentos apresentados: ā€˜Multiculturalismo’ resume-se a isto – pode-se elogiar qualquer cultura no mundo excepto a cultura ocidental, e nĆ£o se pode culpar qualquer cultura no mundo excepto a cultura ocidental.ā€

Entretanto, noutros países da Europa, designadamente na Europa Central (Hungria, CroÔcia, Polónia, entre outros) fechavam-se as portas à imigração, erguiam-se redes de arame farpado, patrulhavam-se as fronteiras, impedia-se a circulação de imigrantes, refugiados e exilados.

NĆ£o vamos historiar tudo, longe disso. Pelas 3 vias principais de acesso ao continente europeu – GrĆ©cia/BalcĆ£s; ItĆ”lia e Espanha – chega diĆ”ria e constantemente gente do Magrebe, da Ɓfrica Sub-sariana, do MĆ©dio Oriente e da Ɓsia Meridional.

Francisco Henriques da Silva

Embaixador, Vice-Presidente da Comissão de Relações Internacionais da Sociedade de Geografia, autor.