Na sua deliberação sobre a queixa de Filipe Froes contra o The Blind Spot, a Entidade Reguladora para a Comunicação Social ignorou a generalidade dos argumentos do pneumologista, nomeadamente a acusação de “conduta imprópria, manipuladora e insultuosa”, e considerou que a peça tem inegável interesse público. Foi salientada a relevância da divulgação dos montantes auferidos pelo médico dada sua projeção mediática e as suas relações estreitas com as farmacêuticas. O regulador apenas considerou que o médico deveria ter sido ouvido, uma vez que o artigo em causa contém “elementos tendencialmente negativos e críticos da sua conduta”. Respeitamos essa perspetiva embora, neste caso, o artigo divulgue essencialmente factos objetivos, que o próprio não nega.
A Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) ignorou a generalidade das acusações do médico Filipe Froes contra um artigo do The Blind Spot, numa deliberação publicada no passado dia 11 de novembro, mas que só recentemente tivemos acesso oficial. Entre outras coisas, o pneumologista queixou-se ao regulador de falta de rigor jornalístico; da não distinção entre factos e opiniões; da suposta irrelevância da divulgação das suas remunerações pelas farmacêuticas uma vez que estão disponíveis no Portal da Transparência do Infarmed; e alegou ausência de conflitos de interesse.
Na sua deliberação, a ERC reconhece o evidente interesse público e jornalístico da divulgação das remunerações do médico Filipe Froes, tendo em conta (1) a sua projeção mediática, (2) as suas posições sobre a vacinação e (3) a sua relação estreita com as farmacêuticas.
Acolhe também o nosso argumento de que não é pela informação estar disponível no Portal da Transparência que ela é conhecida ou acessível a todos os cidadãos, fazendo sentido essa distinção e o tratamento jornalístico desses pagamentos feitos pelas farmacêuticas.
Ficou, desta forma, rejeitado o argumento de Filipe Froes de que, por existirem dados fragmentados no Portal da Transparência, não deveriam ser tratados e divulgados jornalisticamente, de forma compilada.
O regulador dos média salienta, igualmente, o facto de as fontes originais estarem presentes no artigo do The Blind Spot e poderem ser consultadas diretamente pelos leitores.
Filipe Froes deveria ter sido consultado
O único ponto que a ERC afirma não termos cumprido foi o dever de “ouvir as partes com interesses atendíveis nos casos de que se ocupem” (Estatuto do Jornalista, nº1, alínea e).
A argumentação dada, prende-se com o facto de, segundo a ERC, a sua auscultação seria “imprescindível” para dar a sua perspetiva dos factos, já que a peça se foca no queixoso e em “elementos tendencialmente negativos e críticos da sua conduta”.
Ora, percebendo este ponto de vista e concordando com a importância desse direito, consideramos, no entanto, que pelo facto de a peça se centrar em dados e factos objetivos e públicos, e pelas referências ao alinhamento do médico com as farmacêuticas serem incontroversas, não era requerida essa consulta. Tratando-se, assim, de uma opção jornalística válida.
A interpretação que a ERC faz, de que os factos são “tendencialmente lesivos” é legítima, mas não nos cabia a nós fazê-la e, por esse motivo, centrámo-nos nos dados objetivos que dispensariam essa consulta.
Além disso, já tentámos noutra ocasião questionar Filipe Froes sobre alguns destes assuntos e saber a sua posição, sendo que não obtivemos qualquer resposta.
Audiência de conciliação
A deliberação é parca quanto ao que se passou na audiência de conciliação, afirmando apenas que não foi possível chegar a um entendimento.
É pena que não tenha sido resumido o que lá se passou, pois, muitas das dúvidas sobre este caso seriam certamente dissipadas.
Quando nos foi solicitado um pedido de desculpa pelo dr. Filipe Froes, nós afirmámos que seríamos os primeiros a fazê-lo se algo que tivéssemos dito fosse falso ou insultuoso. Contudo, nenhum ponto nos foi apresentado.
Outro dos muitos momentos caricatos aconteceu quando confrontámos Filipe Froes com as suas próprias declarações de conflitos de interesse que coloca nos artigos científicos em que participa, dado que nega tê-los. E a sua resposta foi: “Temos de colocar os nossos conflitos de interesse, para mostrar que não temos conflitos de interesse”.
Ver também:
Médico Filipe Froes recebeu meio milhão de euros das farmacêuticas nos últimos anos – The Blind Spot
Editorial: Desinformação, conflitos de interesse e ética segundo Filipe Froes – The Blind Spot
Queixa de Filipe Froes na ERC contra o The Blind Spot e a nossa resposta – The Blind Spot
theblindspot.pt/wp-content/uploads/2024/10/Queixa-Dr.-Filipe-Froes.pdf