Comissão Europeia canalizou 650 milhões de euros para o combate à “desinformação” e ao “discurso de ódio”

Um novo relatório estima que os gastos da Comissão Europeia na ‘guerra’ contra a “desinformação” e o “discurso de ódio” já rondam os 650 milhões de euros. Com o sugestivo título Manufacturing misinformation: The EU-funded propaganda war against free speech, o relatório da MCC brussels mostra como a União Europeia financiou centenas de projectos de organizações não-governamentais (ONG) e universidades com o fim de ‘higienizar’ o discurso público. 

Com palavras contundentes, o autor do relatório condena aquilo que diz ser, “na verdade, um ataque sistemático à liberdade de expressão na Europa” e acusa a Comissão de “construir uma infraestrutura ideológica para controlar narrativas políticas e moldar a opinião pública”.  

A ‘guerra’ da Comissão Europeia contra a “desinformação” e o “discurso de ódio” já custou 648.890 milhões de euros aos contribuintes europeus, segundo um novo relatório da MCC Brussels, um think-tank de uma universidade húngara. De acordo com o relatório de 59 páginas, intitulado Manufacturing misinformation: The EU-funded propaganda war against free speech, a Comissão financiou centenas de organizações não-governamentais (ONG) e universidades com vista à realização de 349 projectos que visavam combater a desinformação.  

Apelidando esta empreitada como um “Ministério do Controlo da Narrativa”, a MCC Brussels – conotada com a direita política e com o Governo de Viktor Órban – condena fortemente estes esforços do executivo comunitário europeu. “Aquilo que é apresentado como combate ao ‘discurso de ódio’ e à ‘desinformação’ é, na verdade, um ataque sistemático à liberdade de expressão na Europa, concebido para construir uma infraestrutura ideológica para controlar narrativas políticas e moldar a opinião pública”, lê-se no relatório. 

Com efeito, o autor, Norman Lewis, investigador especializado em tecnologia e inovação, tece duras críticas à Comissão Europeia e estabelece até paralelos entre a sua actuação e o famoso romance distópico “1984”. “O dinheiro dos contribuintes tem sido conscientemente utilizado para financiar um complexo de desinformação orwelliano para ditar e controlar a linguagem do debate público”, afirma.    

Fonte: https://brussels.mcc.hu/uploads/default/0001/01/9fcfc904bd2e930bef107b7725b7f3ff9d0779d0.pdf

Para calcular os montantes em causa, Lewis recorreu ao Portal de Financiamento e Concursos da União Europeia (UE), onde constam os projectos relativos ao “Discurso de Ódio” e à “Desinformação”, além da base de dados do Programa Horizon, o CORDIS. 

Autor do relatório acusa Comissão de gastar mais dinheiro para ‘policiar’ o discurso do que para investigar o cancro 

No entanto, o investigador explica que o valor de quase 650 milhões de euros pode pecar por defeito e ser apenas a “ponta do icebergue”, já que há outros projectos que, embora não estejam identificados como tal, também promovem a narrativa da “desinformação” e do “discurso de ódio”. 

Em todo o caso, esta verba, compara Lewis, é cerca de 31% superior àquela que a Comissão destina aos projectos de investigação e inovação relacionados com o cancro, que é de 494 milhões de euros.  

Porém, além de expor a dimensão do financiamento europeu nesta matéria, o relatório constitui sobretudo uma “intervenção democrática” e uma forma de “soar os alarmes sobre como a Comissão mina a liberdade de expressão e a democracia em nome da democracia e da liberdade de expressão”.   

“Quando a Comissão define o que pode ser dito, quem pode dizê-lo e como deve ser enquadrado, não protege a democracia, mas mina-a. Outrora a pedra angular da identidade europeia, a liberdade de expressão está enterrada sob a linguagem tranquilizadora da confiança, da segurança e da coesão, enquanto aqueles que falam contra este processo são silenciosamente apagados”. 

Para o investigador, a “cruzada” da União Europeia para “controlar a narrativa política na Europa” iniciou-se em 2016, aquando do Brexit e da primeira eleição de Donald Trump. Desde então, refere, tem sido feita levada a cabo com pouco escrutínio público. 

O financiamento da UE para alguns dos maiores projectos 

O relatório debruça-se sobre vários destes projectos da UE, nomeadamente aqueles que têm como alvo o discurso de ódio, o extremismo de direita e a desinformação nos meios digitais. Neste âmbito, destacam-se o FAST LISA, um projecto coordenado pela Universidade de Bolonha e parcialmente financiado pela Comissão com 568.165 euros, e o REASON, que ‘nasceu’ em 2021 e recebeu 250 mil euros. 

Alguns, focam-se particularmente no discurso de ódio; como o projecto de investigação RECO-DAR, no qual participa uma ONG austríaca, e que tem como objectivo “provar” que o discurso de ódio tem vindo a aumentar de forma constante na comunidade alemã online nos últimos anos. Foi financiado com 269.310 euros. 

Já o TITAN: AI for Citizen Intelligent Coaching against Disinformation foi desenvolvido para ajudar os cidadãos a avaliar a verdade da informação que circula na internet, através de investigação feita pela Inteligência Artifical (IA) e fact-checking. O TITAN “promete melhorar o pensamento crítico e a literacia mediática através de um “coaching inteligente” adaptado ao perfil do utilizador, às suas competências e viéses cognitivos”, lê-se no relatório. Recebeu 5.734.395 euros da Comissão. 

Outros, têm como finalidade a criação de novas ferramentas para auxiliar nesta ‘guerra’. É o caso do VIGILANT, concebido para desenvolver uma plataforma que “ajude a polícia a combater crimes de ódio” na internet. Na alçada do Programa Horizon, e coordenado pela Universidade Trinity de Dublin, o VIGILANT recebeu 3.376.604 euros. 

Também através do Programa Horizon, o VERA.AI teve o financiamento de 5.691.875 euros, e foi criado para dar resposta “à crescente sofisticação da desinformação online, com o objectivo de criar ferramentas baseadas em IA para detectar conteúdos falsos e apoiar os profissionais dos meios de comunicação”.  

Em termos de legislação, o relatório fala também na Lei dos Serviços Digitais – referindo que, além de determinar quem pode, e o que pode ser dito no ciberespaço, esta lei “codificou a novilíngua orwelliana no coração da linguagem da UE”. 

“Não se trata de censura no sentido directo e autoritário. É a criação de uma arquitectura discursiva que gere a dissidência através do controlo da linguagem – redefinindo o que conta como discurso aceitável e quem consegue moldá-lo. Não silencia vozes; submerge-as sob ondas de eufemismo, análise e política”, acusa Norman Lewis. 

Fontes 

Executive Summary: Manufacturing Misinformation: The EU-funded propaganda war against free speech 

Ver também 

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