Mais uma história mal contadaĀ  – Caos no centro de Dublin

ByVitor Vicente

28 de Novembro, 2023 ,

Tudo começou com um esfaqueamento. Eu sei que aconteceu na quinta-feira passada, mas parece que o público caiu numa amnésia seletiva e tudo o que retivemos foram os consequentes tumultos em Dublin. Como um livro que nos foi entregue sem as primeiras pÔginas, e do qual, por falta de contexto, apontamos o dedo ao vilão errado.

Nada de novo por estas bandas. As massas foram manipuladas da mesma forma com a guerra Rússia-Ucrânia, sendo-lhes dito que o conflito começou naquele abominÔvel dia em que o Kremlin decidiu atravessar a fronteira e não em 2014 com o golpe de estado em Kiev.

Voltemos Ć  Irlanda e Ć  leveza que um punhado de indivĆ­duos, incluindo duas crianƧas, provavelmente experienciou ao final de mais um dia, quando um homem argelino os atacou com uma faca. O motivo do crime mantĆ©m-se desconhecido. Algumas das vĆ­timas acabaram de sair do hospital após vĆ”rios dias a lutar pelas suas vidas e nĆ£o conseguem falar. Certamente que os pequenitos nĆ£o terĆ£o quaisquer interacƧƵes anteriores a revelar que possam esclarecer os motivos – se Ć© que existem, alguns para alĆ©m da maldade – do magrebino.

De qualquer modo, os grandes meios de comunicação social não estariam interessados em ouvir as suas palavras. O rÔcio de artigos publicados que se referem ao esfaqueamento (ou, como lhe chamam, ao incidente, o que para mim seria mais adequado a um confronto entre gangs, ou algo do género) em relação aos tumultos é provavelmente 1 para 7.

O foco foi estrategicamente deslocado para a multidão que saiu à rua de forma agressiva. Não o vi em primeira mão, mas tendo crescido como filho de um sindicalista que participou ativamente em manifestações pelos direitos dos trabalhadores e que se mostrava muitas vezes irritado com a infiltração de anarquistas a sabotarem a causa com violência, estou em crer de que algumas pessoas estavam simplesmente a expressar o seu descontentamento com a imigração massiva no seu país, enquanto os habituais arruaceiros  aproveitaram a porta aberta para se meterem em confusões e talvez receberem presentes de Natal de graça.

Não só os roubos, mas o nível de caos fez-me lembrar os chamados protestos pacíficos nos Estados Unidos na sequênciada morte de George Floyd (outro acontecimento cujos primeiros capítulos não foram partilhados connosco, e que aparentemente não começou com um polícia a usar o joelho para deter pelo pescoço). Estes motins eram perfeitamente aceitÔveis para o establishment. As pessoas estavam nervosas por causa da pandemia e a comunidade negra não conseguia lidar com o racismo sistemÔtico. Ponto final.

A multidĆ£o furiosa com o esfaqueamento de cinco indivĆ­duos, nĆ£o teve a supradita carta branca para expressar a sua raiva. Pelo contrĆ”rio, foram prontamente apelidados de ā€œextrema-direitaā€, um termo genĆ©rico e utilizado atualmente para descrever qualquer pessoa que se atreva a desobedecer Ć  narrativa dominante.

As poucas menções que restaram sobre o esfaqueamento (desculpem flocos de neve, incidentes) remetem para o corajoso brasileiro que usou o seu capacete para evitar que a cena se agudizasse. Por uma vez na vida, a manada tem razão: ele é um herói. O rapaz não merece uma noite inteira de bejecas, mas bar aberto para o resto da vida.

Ɖ evidente que os elogios nĆ£o sĆ£o ingĆ©nuos. Ele estĆ” a ser usado como um Ć­cone para defender o fluxo contĆ­nuo de imigração, em contraste Ć  mensagem do povo que provocou os motins.

Intencionalmente ou nĆ£o, a história estĆ” claramente mal contada, deixando de fora o facto de um imigrante ter impedido outro imigrante de tirar a vida a inocentes. Ɖ evidente que este nĆ£o Ć© o momento de promover a diversidade e o multiculturalismo, mas sim de refletir sobre as nossas fronteiras e repor um critĆ©rio firme.

Os principais meios de comunicação social e, por extensão, a população sem cérebro, estão mais preocupados com um autocarro queimado do que com uma criança a batalhar pela sobrevivência num hospital irlandês.  Mais um exemplo de amnésia selectiva, como vimos com a falta de empatia para com as vítimas de 7 de outubro, comparada com a interminÔvel solidariedade para com os habitantes de Gaza.

Tiro o chapƩu ao Caio, o motorista brasileiro da Deliveroo. A Irlanda precisa de tipos trabalhadores como ele para virilizar a sociedade. Que as nossas forƧas de seguranƧa ponham os capacetes para enfrentar as ameaƧas terroristas. A Europa estƔ farta de importar escumalha.