Tribunal de Contas Europeu: Ausência de transparência nos gastos de 650 mil milhões para recuperar da crise Covid

Um recente relatório do Tribunal de Contas Europeu tece críticas graves ao programa implementado pela Comissão Europeia que supostamente deveria responder à crise covid. Revela que, entre muitas outras coisas, o programa não permite saber quais os custos reais de cada projeto, quem são os destinatários finais do dinheiro ou se ele chegou sequer à economia real. Entre as várias irregularidades encontradas, destacam-se as relacionadas com a transição energética, tendo as auditorias revelado, só em relação a três domínios (edifícios eficientes, sistemas energéticos inteligentes e caminhos de ferro), uma sobrestimação de 34,5 mil milhões de euros por terem sido ignoradas as emissões de gases da fase de construção dos investimentos.

O Mecanismo de Recuperação e Resiliência (MRR) foi a principal resposta da União Europeia (UE) à crise da covid. Até ao final de 2024, foram autorizados 650 mil milhões de euros. E, agora, um relatório do Tribunal de Contas Europeu veio apontar inúmeras deficiências a esse programa. Entre as críticas, o tribunal considera que o MRR não é um mecanismo de financiamento baseado no desempenho, impedindo desse modo a prestação de contas.

Afirma, também, que é impossível medir “a sua eficiência na despesa e a sua relação custo-benefício”, já que a Comissão Europeia não recolhe dados sobre os custos reais e as informações sobre os resultados são escassas.

Além disso, o termo “destinatário final” nem sempre é utilizado da mesma forma e o facto de os fundos serem pagos aos Estados-Membros “não significa que tenham chegado aos destinatários finais e à economia real”.

Investimentos “climáticos”

Entre as várias irregularidades encontradas, está a utilização do dinheiro para despesas relacionadas com a “transição energética”. Auditorias do Tribunal revelaram que alguns coeficientes climáticos (setor ferroviário, redes elétricas e novos edifícios) levaram a grandes distorções.

O relatório refere, nomeadamente, o facto de não terem sido levadas em conta as emissões de gases com efeito de estufa da fase de construção dos investimentos, o que faz com que o contributo climático real fosse inferior. Segundo o Tribunal, mesmo aplicando coeficientes climáticos mais conservadores, calculou-se uma sobrestimação de cerca de 34,5 mil milhões de euros em relação a três domínios de intervenção (edifícios energeticamente eficientes, sistemas energéticos inteligentes e caminhos de ferro).

O TCE dá, como exemplo, um coeficiente que conduziu a uma sobrestimação do contributo do MRR para os objetivos climáticos da EU. O Regulamento MRR atribui um coeficiente climático de 40% à construção de qualquer novo edifício altamente eficiente, mas o Tribunal considera que a construção de novos edifícios não gera qualquer poupança real de energia.

E entende que, neste caso, não se justifica o coeficiente climático de 40% atribuído e que esse coeficiente deveria ser de 0%.

Financiamento

O MRR é financiado quase exclusivamente através da contração de empréstimos nos mercados, sendo cerca de metade do financiamento concedido aos Estados-Membros sob a forma de empréstimos.

No entanto, isso foi feito quando as taxas de juros eram historicamente baixas e sem qualquer precaução quanto ao seu possível aumento, e sem estabelecer antecipadamente um plano de reembolso do empréstimo, especificando de onde virá esse dinheiro.

Desde então, as taxas de juros dispararam e os custos de financiamento podem ser mais do que o dobro das estimativas iniciais até 2026; o que, a somar aos reembolsos, pressionará os próximos orçamentos da UE.

Fontes:

Documento de Análise 02/2025: Orientação para o desempenho, prestação de contas e transparência – ensinamentos a retirar das insuficiências do MRR

NEWS-RV-2025-02 | European Court of Auditors