Se fossem necessárias mais provas, os recentes casos de violência provariam de forma inequívoca como a retórica da proteção contra “o discurso de ódio” e a preocupação com os fenómenos extremistas não são mais do que pretextos para atacar quem coloca em causa interesses políticos e mediáticos.
Se não, vejamos os três casos de violência ocorridos na passada terça-feira. Por um lado, um actor é atacado selvaticamente por um individuo que, aparentemente, pertence a um grupo extremista “Sangue e Honra”. Desde esse momento que a comunicação social, de forma incessante tenta ligar esse ato de agressão à “extrema direita”, ao nacionalismo e até a um partido político.
Apesar de aparentemente o ataque ter sido desferido por apenas um sujeito (sendo que outros terão insultado atrizes), a agressão é descrita como “ataque de grupo de extrema direita”. Apesar o ataque ter sido desferido contra um homem português branco, não faltaram intervenções a sugerir motivações racistas e xenófobas.
E, desde esse momento, que a comunicação social tenta criar uma narrativa, diretamente ou através da maioria dos seus comentadores, de que existe uma enorme onda de extremismo associada a essa área política e que isso é alimentado pelas terríveis redes sociais.
No mesmo dia, quatro adeptos do FC Porto são atacados por um conjunto de adeptos do Sporting que lançaram engenhos incendiários para dentro do seu carro, que ficou totalmente carbonizado. Dois adeptos sofreram queimaduras, e foram transportados para o Hospital, e dois foram assistidos no local.
Apesar da maior gravidade dos ferimentos, de um maior número de feridos e de se tratar de uma aparente tentativa de homicídio, o caso mereceu menor destaque – menos notícias, menos entrevistas, menos peritos a analisarem o fenómeno. Alguma imprensa fala mesmo de um “ataque ao carro” onde iam adeptos (devia ser um Tesla).
Apesar da evidente motivação clubística e de serem frequentes agressões, e até algumas mortes em ataques do género, já não se falou em culpar toda a claque a que pertenciam, o clube, os seus dirigentes ou os adeptos de futebol em geral (ataques graves têm-se repartido pelos principais clubes).
Nada de associar e atribuir responsabilidades aos principais canais televisivos que têm programas em que se promove o tribalismo clubístico e, em alguns casos, se convocam as figuras mais agressivas, que com frequência exibem discursos inflamados e desferem insultos. Mas isso já não é discurso de ódio, nem incentiva a violência.
Por último, no mesmo dia, um pai terá morto a tiro o filho, supostamente devido ao “casamento de tradição cigana com uma menina da família, de apenas 14 anos”.
Curiosamente, apesar de ser o caso com o desfecho supostamente mais grave, foi o que menor cobertura e discussão gerou. Não se falou da violência dentro desta comunidade, mesmo com os mediáticos casos de violência e assassinatos que ocorreram recentemente envolvendo esta comunidade, e muito menos se generalizou este tipo de comportamento a todo esse grupo.
Tão pouco existiram programas sem fim, comentadores e especialistas a debruçarem-se sobre estes casamentos de “meninas de 14 anos”. O que não deixa de ser estranho porque grande parte dos nossos especialistas televisivos aponta frequentemente a misoginia, que a nossa sociedade patriarcal impõe às mulheres, como um dos nossos grandes flagelos.
Pelo que parece, temos todos de respeitar a cultura desse povo, mesmo que contrarie os princípios básicos da nossa. Até porque, como muitos dizem “a cultura portuguesa não existe” ou não merece ser respeitada.
E assim, ironicamente, a confirmar-se a história, o cigano, que morreu às mãos do pai, aparentemente revoltado com uma tradição anacrónica e desumana, não merece destaque nem elogios. O verdadeiro herói será esquecido, não se encaixa nas narrativas.
Narrativas que, apesar de todos estes e outros esforços, se estão a desmoronar a olhos vistos e em que cada vez menos acreditam.