O tĆtulo propositadamente provocatório deste artigo, evocativo de uma importante efemĆ©ride, que nĆ£o obstante do seu recente revisionismo e sucessivas tentativas de alteração, continua ainda assim viva em alguns de nós e a permitir que pelo menos estas palavras aqui presentes, sejam escritas e nĆ£o menos importante, que o leitoras leia, embora jĆ” com algum esforƧo, dada a cada vez maior alienação a que Ć© sujeito e as inĆŗmeras tentativas que tĆŖm sido feitas de uniformização quer do discurso, quer do pensamento que lhe dĆ” origem, limitando assim ou censurando aquilo que Ć© dito, quem o diz, e naturalmente como o diz.
Apesar da constatação, cĆ” estamos, a tentar colocar alguma luz num ambiente cada vez maisesteril(izado) e higienizado, onde a reflexĆ£o e o espĆrito crĆtico correspondem a um perigo iminente que ameaƧa a nossa seguranƧa e condição humanas, pelo menos Ć© essa a narrativa e justificação apresentadas ao longo destes anos em diversos domĆnios da nossa vida.
Assim este tĆtulo escolhido, um oximoro (jĆ” que encerra na mesma frase, duas ideias contrĆ”rias entre si) para alguns, mas uma verdade de La Palice e coerente para outros, (sobretudo aqueles que Ć revelia de todos os cidadĆ£os, estĆ£o a tentar mudar aconstituição da RepĆŗblica Portuguesa e o seu texto fundamental, subvertendo assim o conceito de liberdades e garantias e subalternizando estes, a questƵes de mero contexto onde as mesmas poderĆ£o ser suspensas, revogadas, ou atĆ© mesmo restringidas temporĆ”ria oudefinitivamente consoante certas e determinadas condiƧƵes, ou fenómenos que se verifiquem). Tudo isto encaixa que nem uma luva, dado que para termos hoje uma liberdade reconhecida, temos que abdicar de inĆŗmeros direitos, entre eles o direito principal de questionar, livremente condutas e narrativas, pejadas de incoerĆŖncias e erros desde o momento em que surgem aos nossos olhos como dogmas absolutos, aos quais serĆ” sacrilĆ©gio e heresia indagar.
Ć nesta dualidade imposta, que todos nós estamos cada vez mais envolvidos, confrontados com a noção obtusa e completamente anedótica, e porque nĆ£o dizer esquizofrĆ©nica, de prescindir da nossaliberdade, em detrimento de proteção e comodismo, proporcionada por um conjunto de conceitos, que mais nĆ£o sĆ£o, do que a própria antĆtese da tal liberdade, que tanto estamos dispostos a sacrificar para ter!?!!?
Se o leitor atento, considera que o que acabou de ser dito nĆ£o faz sentido nenhum, Ć© porque na realidade nĆ£o faz mesmo, mas nĆ£o Ć© por isso que inĆŗmeras ādoutas vozesā cessam de se levantar, para regulamentar e definir limites Ć nossa liberdade e atĆ© Ć mobilidade que o nosso corpo poderĆ” estabelecer no espaƧo, e agora mais recentemente tambĆ©m no tempo.
São aliÔs estas premissas, que estão presentes no texto seminal da revisão constitucional dos partidos do arco da governação, texto esse, que jÔ foi alvo de inúmeras queixas-crime, por parte dos cidadãos (tal é a aberração que tentam aprovar e impor), assim como dos diversos tratados internacionais relacionados com saúde, que estão a ser cada vez mais questionados e postos em causa, não obstante o esforço hercúleo para que se mantenham escondidos da generalidade da população.
Se existe denominador comum a todos eles, ele é sem dúvida a Liberdade condicionada, um conceito revisto que substitui a anterior, denominação, porque cessa o valor absoluto que a caracterizava, para a tornar em relativa e (a)condicionada a fatores e (pre)conceitos nos quais a mesma se passa a inscrever.
Pre(con)ceitos e determinações essas que é preciso referir, são convenientes e coniventes com o status quo quer nacional quer internacional.
SĆ£o disso exemplo conceitos tais como a mais recente āsituação pandĆ©micaā, apresentada pela UniĆ£o Europeia no rascunho zero do tratado homónimo, confinamentos climĆ”ticos, mobilidade restrita ou circunscrita a 15 minutos nas tais cidades maravilha, ou a proibição de circulação em casos de desastres naturais, como incĆŖndios, e ainda o isolamento profilĆ”tico por tempo indeterminado, caso este se apresente como um perigo pĆŗblico ou algo similar, todos eles aparentemente benignos e atĆ© bem intencionados, tĆŖm vindo a ser paulatinamente endossados ao nosso lĆ©xico gramatical do quotidiano, interferindo assim com o entendimento que fazemos do mundo e substituindo a forma como todos nos relacionamos entre nós e, mais importante, com os tais pderes que aparentemente nos (r)odeiam.
Nessa intermitĆŖncia constante, a liberdade vai nos sendo retirada e devolvida consoante a nossa obediĆŖncia e complacĆŖncia sendo aditivadas a cada momento regras e mais regras, que a breve trecho alteram definitivamente a definição, tudo claro em benefĆcio do chamado bem comum.
Neste cenÔrio é certo que a palavra liberdade, extremamente modificada, vai continuar a existir assim como os discursos bonitos atestando a sua validade constante e ininterrupta, como o depósito de gasolina de um automóvel, e inflamando a opinião pública, bem como o coração dos néscios que acordarão a cada revisão executada, para logo de seguida voltar a entrar no seu sono letÔrgico profundo de ignorância e alienação em relação à sua condição gritante e evolutiva de escravo (e)terno.
Enquanto isso a tal liberdade que tĆ£o bem conhecemos, essa na forma e no conteĆŗdo, vai-se modificando de forma ampla ao ponto de ser um privilĆ©gio, ao alcance de alguns poucos, em que os requisitos hoje uns, amanhĆ£ outros, se vĆ£o complexificando e demandando cada vez mais de todos aqueles que colaboraram desde o inĆcio.
Ainda assim gritamos em unĆssono e a plenos pulmƵes tal hipócritas, viva a liberdade, pelo menos aquela que ainda nos resta para que nos possamos manifestar desse modo e congratular pelo menos enquanto isso ainda for possĆvel e nĆ£o for considerado um perigo para a normativa sociedade que se desenha a passos largos no horizonte Ć vista de todos.
Quanto ao escravo que paulatinamente nos tornamos na direta proporcionalidade da nossa indiferenƧa, continuarĆ” a vociferar que Ć© livre enquanto cada vez mais e de modo corriqueiro, tudo aquilo que os seus antepassados conquistaram com inĆŗmeras lutas e sacrifĆcios vai lhe sendo retirado.
Afinal de contas neste AdmirÔvel Mundo Novo, que jÔ se iniciou hÔ algum tempo, é expectÔvel que ele não tenha nada, mas seja feliz.
Com tanto que não tome consciência da sua condição miserÔvel e se rebele, poderÔ continuar a vociferar aos quatro ventos viva a liberdade pelo menos aquela que lhe permite dizer tudo de acordo com as normas e o establishment vigente, afinal de contas e ao que parece é essa e sempre foi a raiz e a interpretação da palavra Liberdade para todos nós, não é mesmo?
Bruno Miguel Monarca