Skip to content

Covid-19, farmacêuticas e políticos – Gestão de interesses

Os organismos internacionais ligados às instituições governamentais, como é o caso da Organização Mundial de Saúde (OMS), Agência Europeia do Medicamento (EMA) e Infarmed, por exemplo, são responsáveis por mecanismos de aconselhamento, regulação e controlo apertado sobre a indústria farmacêutica e da saúde. Segundo os reguladores, o foco está na segurança das pessoas e na prevenção de conflitos com interesses económicos e financeiros, que nunca deverão sobrepor-se à saúde dos cidadãos. No entanto, a produção das vacinas covid-19 tem sido alvo de críticas pela forma como a indústria omite ou atrasa a divulgação dos dados sobre os ensaios clínicos e a monitorização da farmacovigilância dos seus produtos. São exemplo disso a decisão de um tribunal norte-americano, no início de janeiro de 2022, em ordenar que a Food and Drug Administration (FDA), o regulador norte-americano do medicamento, divulgue os dados públicos sobre a vacina da Pfizer em oito meses, em vez dos 76 anos que o fabricante disse que ia demorar, conforme noticiou a Reuters [1].

Por seu lado, o British Medical Journal (BMJ), uma das mais conceituadas publicações científicas internacionais na sua área, criticou num artigo, de 19 de janeiro de 2022, a falta de transparência da indústria farmacêutica na divulgação de dados sobre as vacinas e os tratamentos contra a covid-19 [2]. Os seus editores afirmam que “os dados deverão ser completa e imediatamente divulgados para escrutínio público” e que o atraso da Pfizer é “inaceitável” já que “a companhia e os seus funcionários têm toda a informação sobre os ensaios e só pretendem divulgá-los em maio de 2025”.

Aprender com os erros

O mesmo artigo da BMJ enquadra historicamente o problema com a importância da partilha de informação clínica de ensaios, recordando o que se passou no início do século XXI com o Tamiflu. Diz a publicação que “os erros de pandemias anteriores não podem ser repetidos”. O Oseltamivir [3], mais conhecido pela marca Tamiflu, é um medicamento antiviral usado no tratamento das gripes A e B. A comercialização massiva do produto provocou uma quebra mundial da sua disponibilidade, com os governos de vários países a manterem stocks com quantidades inusitadas, ao mesmo tempo que vários estudos apontavam para a ineficácia do Tamiflu na redução de hospitalizações e das complicações provocadas pela gripe. A revista Nature publicou em 2014 [4] um estudo sobre eficácia do Oseltamivir e o seu armazenamento em excesso e a forma como a comunicação social apresentou a discussão, comprometendo a perceção da opinião pública sobre a eficácia do medicamento.

Em 2010, foi a vez de outra pandemia associada a outra gripe – a H1N1, mais conhecida por gripe suína – ter sido alvo de críticas quanto à sua gestão, conforme publicado pela BMJ [5] no mesmo ano. Em maio de 2010, o Conselho da Europa criticou fortemente a OMS, governos e agências europeias pela forma como geriram a pandemia. A sua Assembleia Parlamentar refere que [6] “está alarmada e preocupada sobre algumas das consequências das decisões tomadas e dos avisos feitos que levaram à distorção das prioridades dos serviços públicos de saúde em toda a Europa, o desperdício de avultados recursos financeiros públicos e, igualmente, o medo e receio injustificados sobre os riscos de saúde percecionados pela maioria dos europeus”.

Em 2014, a revista Science in Context, da Universidade de Cambridge, publicou um artigo intitulado “Um risco incerto: as responsabilidades da Organização Mundial da Saúde no H1N1” [7]. Diz o autor, Sudeepa Abeysinghe, que “a OMS argumentou que estava a tentar ser fiel à evidência científica e à incerteza da ameaça. No entanto, como resultado, a narrativa de risco público na OMS não foi consistente nem socialmente robusta, levando à contestação da posição da OMS por parte de outras entidades relevantes na saúde pública global, principalmente o Conselho da Europa”.

Contestação política no Parlamento Europeu

Quanto à gestão da crise provocada pela doença covid-19, várias personalidades da política europeia têm contestado e alertado para o que consideram ser os perigos da crescente onda de autoritarismo que atravessa a Europa. Segundo os críticos, e a pretexto da saúde pública, têm-se verificado a obrigatoriedade da vacina covid-19 e as limitações à liberdade daqueles que optam ou não podem ser vacinados. Relativamente a pandemias anteriores, constata-se uma omissão por parte da comunicação social generalista relativamente às vozes críticas e ao pluralismo da investigação científica e análise política que são feitas por vários decisores.

Desde setembro de 2021 que um conjunto de Membros do Parlamento Europeu (MEPs) tem denunciado, através de conferências de imprensa [8], os “atropelos à liberdade e a utilização abusiva do certificado digital”, dando, como exemplo, o próprio grupo de MEPs a quem é vedada a entrada nas instalações do organismo a que pertencem. O romeno Cristian Terheș tem sido uma das vozes mais críticas às opções do próprio Parlamento, confrontando, por exemplo, a sua presidente, Ursula van der Leyen, com o “crescente autoritarismo dos governos na imposição indiscriminada da vacinação, face aos mais elementares direitos dos europeus” [9].

O francês Jean-Lin Lacapelle tem sido outro dos MEPs a alertar para os perigos da limitação à liberdade e para o deterioramento da saúde pública com a insistência da vacinação obrigatória em massa. A 15 de dezembro, Lacapelle referiu-se no Parlamento contra a não obrigatoriedade da vacinação nas crianças [10] e apelou ao “fim da segregação e à estigmatização dos não vacinados”. Já em novembro, o MEP tinha-se dirigido ao parlamento para contestar as “medidas repressivas, discriminatórias e inconstitucionais contra o povo com o objetivo de acelerar a vacinação em massa” [11].

Mais contundente foi o MEP independente Mislav Kolakušić, da Croácia, quando se dirigiu frontalmente ao presidente francês Emmanuel Macron no Parlamento Europeu, logo após a tomada de posse da França na presidência semestral do organismo, em janeiro de 2022 [12]. “Enquanto presidente da União Europeia, está a fazer exatamente o oposto do que faz em França. Hoje, diz que está orgulhoso por não haver pena de morte na Europa. Dezenas de milhar de cidadãos têm morrido devido às reações adversas à vacina. Vacinações obrigatórias representam uma sentença de morte e a sua execução para muitos cidadãos. É algo que tem que permanecer uma escolha para todos os cidadãos. Assassínio é assassínio. Aqueles que não sabem isso ou que não souberam informar-se, vejam os dados oficiais da Agência Europeia do Medicamento (EMA).”, referiu Kolakušić.

Conflitos de interesses

O conflito de interesses entre os decisores políticos e o setor económico é algo amplamente discutido na sociedade portuguesa e tem sido motivo para a criação de diversos mecanismos de transparência. A indústria farmacêutica e a gestão da doença covid-19 deveria ser escrutinada, incluindo nas mais altas esferas do poder. É o caso de Ursula von der Leyen, Presidente da Comissão Europeia desde final de 2019, e defensora da imposição da vacina. Médica, alemã, é casada com Heiko von der Leyen, também alemão, e Diretor Médico da Orgenesis, uma empresa dedicada a “disponibilizar o potencial da terapia genética e celular para todos” [13]. A empresa alemã tem em desenvolvimento uma vacina contra a covid-19, a Autovac [14].

Por cá, são conhecidos os apoios financeiros da indústria farmacêutica a personalidades como Filipe Froes, coordenador do gabinete de crise da Ordem dos Médicos para a pandemia e consultor da Direção-Geral de Saúde. Froes é um dos médicos mais mediáticos e influentes na gestão da pandemia e “tem ultrapassado nos últimos anos os limites legais de recebimentos da indústria farmacêutica”, tendo em conta as suas funções em organismos estatais, conforme noticiou no início de janeiro de 2022 o jornal online Página Um [15].

Pedro Simas, virologista e um dos principais rostos mediáticos da gestão da doença, esteve envolvido numa polémica relativamente à suspensão de uma campanha publicitária em que participou. Conforme noticiou o jornal Público a 21 de agosto de 2021 [16], a Zeiss, fabricante de lentes oftálmicas, foi obrigado a cancelar em “todos os suportes publicitários” a campanha a uma lente que é apresentada como antiviral e que, segundo a marca, “elimina 99,9% dos vírus e bactérias potencialmente nocivos da superfície da lente”. O mesmo jornal recorda que Pedro Simas foi candidato a vereador da Câmara Municipal de Lisboa nas eleições autárquicas de 2021.

A publicação Página Um deu conta, em janeiro de 2022, da investigação que fez sobre o donativo da farmacêutica norte-americana Merck à Ordem dos Médicos, em Portugal, no valor de 380 mil euros para compras de máscaras FFP2 [17]. Tendo em conta as responsabilidades públicas da Ordem, a mesma foi notificada por entidade pública competente para disponibilizar a informação solicitada pelo Página Um, algo que se recusou a fazer.

Todas as verbas auferidas por indivíduos ou entidades através da indústria farmacêutica podem ser facilmente verificadas no portal da transparência do Infarmed [18].

Democracia e medicina

Vários médicos têm reivindicado que as questões de saúde deveriam ser responsabilidade de medicina e não da política, principalmente quando se pretende generalizar a vacinação contra a covid-19 a crianças e jovens. É o caso da médica cardiologista Teresa Gomes Mota, membro da Fundação Portuguesa de Cardiologia, que, em declarações à Rádio Observador em dezembro de 2021 [19], alertou para o risco das miocardites e pericardites. “Já foram indicados casos em crianças e jovens na sequência das vacinas e sabe-se que esse tipo de reações adversas é raro, mas não sabemos quão raro é”, diz Teresa Mota. “Os ensaios das vacinas nas crianças ainda estão a decorrer e, por isso, não temos dados para dizer se as vacinas são seguras ou não. Estamos a trabalhar com dados de dois meses, o que é muitíssimo pouco.” A cardiologista explica que “o grande problema é que foi só na fase da farmacovigilância, depois da administração da vacina, que começaram a verificar-se os casos das inflamações cardíacas, mais do que é normal por outros vírus ou por outras situações”. Teresa Mota explica que a miocardite é uma doença bastante preocupante: “aparentemente, a curto prazo, não apresenta sequelas. Mas, no futuro, pode ser perigoso porque as inflamações representam a destruição de células do coração que nunca mais serão respostas. O que aparecem são cicatrizes fibrosas no local destas células que vão limitar os estímulos elétricos do coração e o seu normal funcionamento, podendo provocar arritmias que poderão ser fatais”, explica.

No Brasil, ao contrário de Portugal, há um debate público sobre a temática da vacinação contra a covid-19, envolvendo médicos, cientistas, políticos e a população em geral. Existem vários médicos brasileiros que, pedagogicamente, apresentam em audiências públicas as evidências e o conhecimento que possuem sobre a matéria, contribuindo para um melhor esclarecimento da população e de decisores políticos.

O cardiologista e cirurgião cardiovascular João Jackson Duarte, do estado de Mato Grosso do Sul, é um dos exemplos. Na audiência em que participou em Dourados, em novembro de 2021 [20], falou, relativamente à vacina da Pfizer, que “os ensaios estão na fase 3 até maio de 2023, a fase onde se descrevem as reações adversas. E agora queremos dar a vacina a torto e a direito para todos, obrigando-os? Como é possível querer obrigar alguém a tomar uma vacina se não se sabe quais são os efeitos colaterais a longo prazo? É um absurdo!” João Duarte diz que “não é contra a vacina, mas contra a obrigatoriedade” e que “há uma faixa etária que beneficia das vacinas”. Na sua exposição, o cardiologista insiste na questão da segurança das vacinas, comparando o número de reações adversas mortais registado em todas as outras vacinas (150), durante toda a sua existência, com as da covid-19 (18 mil). No que diz a adolescentes, João Duarte relata diversos casos de problemas cardíacos e paralisias nunca antes visto nessa faixa etária e critica a falta de investigação das reações adversas, como também a ausência de consentimento informado.

Carlos A. Gomes

27/01/2022

Referências:

[1] Notícia sobre divulgação de dados da Pfizer – Reuters: https://www.reuters.com/legal/government/paramount-importance-judge-orders-fda-hasten-release-pfizer-vaccine-docs-2022-01-07/

[2] Artigo sobre a urgência de dados sobre vacinas e tratamentos C19 – BMJ: https://www.bmj.com/content/376/bmj.o102

[3] Artigo sobre a Tamiflu – Wikipedia: https://en.wikipedia.org/wiki/Oseltamivir

[4] Estudo sobre Tamiflu – revista Nature: https://www.nature.com/articles/508439a

[5] Artigo sobre a gestão da pandemia H1N1 – BMJ: https://www.bmj.com/content/340/bmj.c3033.full

[6] Relatório sobre a gestão da pandemia H1N1 – Conselho da Europa: https://assembly.coe.int/CommitteeDocs/2010/20100604_H1N1pandemic_e.pdf

[7] Artigo sobre o papel da OMS na pandemia H1N1 – Science in Context: https://www.cambridge.org/core/journals/science-in-context/article/abs/an-uncertain-risk-the-world-health-organizations-account-of-h1n1/485E701EFE1426247A153A3C7AB858BA

[8] Canal de Cristian Terhes com as conferências de imprensa de Membros do Parlamento Europeu – YouTube: https://www.youtube.com/channel/UChD1hiGdBMN8BQ3BHTvcNvw

[9] Conferência de imprensa de MEPs sobre vacinação obrigatória na UE – Parlamento Europeu: https://www.youtube.com/watch?v=YTIvlu9DjdI

[10] MEP Lacapelle sobre a vacinação obrigatória nas crianças – Parlamento Europeu: https://www.youtube.com/watch?v=Q7kv3FJFRA4

[11] MEP Lacapelle sobre a vacinação em massa – Parlamento Europeu: https://www.youtube.com/watch?v=FfOUmU

[12] Discurso do MEP Mislav Kolakušić contra o presidente francês – Parlamento Europeu: https://rumble.com/vt5vmj-croatian-mep-mislav-kolakui-addresses-french-president-macron-at-the-europe.html

[13] Apresentação da Orgenesis: https://orgenesis.com/#/

[14] Cronograma dos produtos Orgenesis, incluindo vacina covid-19 – site Orgenesis: https://ir.orgenesis.com/overview#/

[15] Notícia sobre incompatibilidades de Filipe Froes – Página Um: https://paginaum.pt/2022/01/04/filipe-froes-tem-incompatibilidades-para-ser-consultor-da-direccao-geral-da-saude/

[16] Notícia sobre suspensão de campanha de Pedro Simas – Público: https://www.publico.pt/2021/08/21/sociedade/noticia/zeiss-obrigada-suspender-campanha-virologista-pedro-simas-devido-publicidade-enganosa-1974842

[17] Notícia sobre donativo da Merck à Ordem dos Médicos – Página Um: https://paginaum.pt/2022/01/24/ordem-dos-medicos-tem-de-ceder-documentos-de-donativo-milionario-da-merck-mas-acusa-pagina-um-de-comportamento-criminoso/

[18] Portal da transparência do Infarmed: https://placotrans.infarmed.pt/Publico/ListagemPublica.aspx

CU7Mc&t=25s

[19] Entrevista à cardiologista Teresa Mota – Rádio Observador: https://drive.google.com/drive/folders/1HSNnVKjaeDG_aBg8TEtyxkzCNceuF5HK

[20] Apresentação de cardiologista João Duarte sobre os efeitos das vacinas em audiência pública (Brasil): https://www.youtube.com/watch?v=bKScGAenn6k&list=PLpqoWSojDwBUdixZsW7aywHqFJh-EuFH6

Compre o e-book "Covid-19: A Grande Distorção"

Ao comprar e ao divulgar o e-book escrito por Nuno Machado, está a ajudar o The Blind Spot e o jornalismo independente. Apenas 4,99€.