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Uma geoestratégia dos tempos modernos

Nos tempos que correm, muitos são os que utilizam a palavra geoestratégia, mas serão menos aqueles que dominam a sua definição e amplitude. De acordo com a definição clássica do Contra-Almirante francês Pierre Celerier, a geoestratégia é “o estudo da relação entre problemas estratégicos e fatores geográficos” (Celerier, 1955, pag. 59). Na sua essência, esta definição aponta dois caminhos: o do planeamento, como forma de construir a estratégia e alinhá-la com os fatores políticos, económicos, sociais e outros, que inevitavelmente vão balizar a respetiva implementação; o da geografia, como instrumento para otimizar a localização da estratégia em cada momento e para entender as respetivas repercussões a nível local, regional e mundial.

As tecnologias de informação e, algum tempo depois, a transformação digital, alavancaram o estudo da geoestratégia de uma forma à partida imprevisível. Em primeiro lugar, a tecnologia de informação é a base da globalização massificada das relações humanas, económicas, políticas e sociais. Esta realidade induziu um novo paradigma na valorização geoestratégica de locais e regiões, de países e uniões, de alianças e coligações. Muito do que era dado como adquirido e confirmado caiu por terra e foi necessário reanalisar a realidade com base em novas premissas.

Por outro lado, as tecnologias de informação passaram gradualmente a permitir o cruzamento de dados geográficos, assentes no GPS ou Global Positioning System, com dados de natureza económica, social, demográfica, política, militar ou até criminal, com base nos GIS, ou Geographic Information Systems.

Do trabalho conjunto entre as ferramentas GPS e GIS resultou uma dimensão completamente diferente da realidade, quase caleidoscópica. Movimentações económicas e políticas, fluxos migratórios e avanços militares, durabilidade ou perenidade de governos e, sobretudo, potencial de conflitualidade, passaram a ser analisados em termos geoestratégicos com uma riqueza de informação por vezes desconcertante.

Se a tudo isto associarmos o poder de cálculo, de captação da realidade e de simulação de cenários que a transformação digital aportou, então podemos dizer que a geopolítica entrou decisivamente numa nova era. Hoje, as análises são efetuadas praticamente em cima do acontecimento, com todo o poder tecnológico disponível a robustecer a  sua fiabilidade, através de uma tremenda capacidade de observação, análise e simulação, que propiciam conclusões muito mais assertivas.

Neste contexto, a deteção e previsão de eventuais focos de conflitualidade torna-se uma tarefa fundamental ao nível da segurança e defesa, como forma de alocar recursos em tipologia e quantidades ótimas nos locais adequados. Procura-se, assim, promover sempre que possível por antecipação um efeito dissuasor ou redutor do efeito destes conflitos, a nível humano, social, económico e político. Tal como num incêndio, combate-se o fogo com o fogo para que o mesmo seja extinto.

Referência : Celerier, P. (1955). Geopolitique et Geostrategie. Paris: PUF.

José Alberto Pereira

PhD, Wagner Watch Project, Eurodefense Portugal

Doutorado em gestão, especialista em geoestratégia, economia da defesa e Grupo Wagner. Professor, investigador, escritor, poeta, viajante e fotógrafo. Rotário, ativista social, melómano e filantropo.

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