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TC julga inconstitucional confinamento obrigatório fora do estado de emergência

A segunda secção do Tribunal Constitucional concluiu que os confinamentos obrigatórios impostos fora do período de estado de emergência, foram inconstitucionais. A decisão teve o voto favorável dos cinco juízes que a integram.

Num acórdão assinado a 24 de junho, pelo conselheiro António José da Ascensão Ramos, do Tribunal Constitucional (TC), cinco juízes que integram a 2ª. Secção do TC votaram a favor e consideraram os confinamentos fora do estado de emergência, inconstitucionais.

O caso em análise

A decisão foi tomada no seguimento de um pedido de habeas corpus, após ter sido determinado o isolamento em casa dos alunos de turmas em contacto com casos positivos de Covid-19 diagnosticados na escola, através de decisão administrativa do Delegado de Saúde da área da residência.

“Na decisão recorrida, porém, ficou apenas em causa a imposição de confinamento obrigatório à visada durante nove dias (de 16.12.2021 a 24.11.2021) por ter sido diagnosticado um caso de COVID19 num aluno da turma em que a requerente estava integrada em ambiente escolar.

O fundamento da medida não assentou, pois, numa situação de doença ou de infeção com SARS-Cov2 da pessoa visada que se pudesse dizer compreendida no artigo 3.º, n.º 1, alínea a) do RARes.CM n.º 157/2021 de 27.11, mas em mera proximidade de contexto com portador do vírus, que terá compelido o Delegado de Saúde Regional a determinar o isolamento da requerente de habeas corpus com recurso ao disposto na alínea b) do n.º 1, do mesmo articulado legal.”

Inconstitucionalidade fora do estado de emergência

O TC considerou inconstitucional os confinamentos obrigatórios fora do período de estado de emergência, de acordo com o que consta no ACÓRDÃO Nº 466/2022 e destacou que a “situação de calamidade não tem relevância constitucional para efeitos de suspensão de direitos, liberdades e garantias (…)”.

“a «situação de calamidade» não tem relevância constitucional para efeitos de suspensão de direitos, liberdades e garantias, relevando para esse efeito apenas a «calamidade» que funda a declaração do estado de emergência (artigo 19.º, n.º 2, da Constituição) – «[o] estado de emergência constitucional é declarado com o objetivo de promover o regresso à normalidade. A situação de calamidade administrativa visa o mesmo objetivo, mas, em vez de atuar por via da suspensão dos direitos fundamentais, persegue-o no âmbito de um quadro legislativo que envolve restrições específicas e predefinidas desses mesmos direitos»”

Decisão do Tribunal

Assim, foi julgado inconstitucional a norma do artigo 3º. 3.º, n.ºs 1, alínea b), 2 e 3 do Regime anexo à Resolução do Conselho de Ministros n.º 157/2021, de 27.11, que aborda três tópicos sobre o confinamento obrigatório.

“Artigo 3.º

Confinamento obrigatório

1 – Ficam em confinamento obrigatório, em estabelecimento de saúde, no domicílio ou, não sendo aí possível, noutro local definido pelas autoridades competentes:

a) Os doentes com COVID-19 e os infetados com SARS-CoV-2;

b) Os cidadãos relativamente a quem a autoridade de saúde ou outros profissionais de saúde tenham determinado a vigilância ativa.

2 – As autoridades de saúde comunicam às forças e serviços de segurança do local de residência a aplicação das medidas de confinamento obrigatório.3 – De acordo com a avaliação da situação epidemiológica e do risco concreto, da responsabilidade da administração regional de saúde e do departamento de saúde pública territorialmente competentes, os cidadãos sujeitos a confinamento obrigatório podem ser acompanhados para efeitos de provisão de necessidades sociais e de saúde, mediante visita conjunta da proteção civil municipal, dos serviços de ação social municipais, dos serviços de ação social do Instituto da Segurança Social, I. P., das autoridades de saúde pública, das unidades de cuidados e das forças de segurança, bem como, mediante despacho do membro do Governo responsável pela área da saúde e da área setorial respetiva, quaisquer outros serviços, organismos, entidades ou estruturas da administração direta ou indireta do Estado.”

III. Decisão

1. Nestes termos e com estes fundamentos, decide-se julgar o recurso improcedente, e, em consequência

a) Julgar inconstitucional a norma do artigo 3.º, n.ºs 1, alínea b), 2 e 3, do Regime anexo à Resolução do Conselho de Ministros n.º 157/2021, de 27.11 (com referência aos n.ºs 2 e 10 da Resolução), por violação do disposto no artigo 27.º, n.ºs 1, 2 e 3, da Constituição da República Portuguesa;

b) Julgar inconstitucional a norma do artigo 3.º, n.ºs 1, alínea b), 2 e 3, do Regime anexo à Resolução do Conselho de Ministros n.º 157/2021, de 27.11 (com referência aos n.ºs 2 e 10 da Resolução), por violação do disposto no artigo 165.º, n.º 1, alínea b), com referência ao artigo 27.º, n.º 1, ambos da Constituição da República Portuguesa.

2. Sem custas, por não existir incidência aplicável (artigo 84.º, n.º 1 e n.º 2, a contrário, da Lei n.º 28/82 de 18.01).

Lisboa, 24 de junho de 2022 – António José da Ascensão Ramos”

A 1 de fevereiro de 2022, o Juízo de Instrução Criminal que recebeu os requerimentos já havia declarado inconstitucional, material e organicamente a ordem administrativa e determinado a imediata libertação dos jovens.

Sujeitou ainda a responsabilidade criminal quem pretendesse, baseando-se na ordem declarada ilegal, compelir os alunos a permanecer na habitação sem possibilidade de frequentar a via pública. O Ministério Público recorreu para o TC.

Referências:

ACÓRDÃO Nº 88/2022

ACÓRDÃO Nº 89/2022 

ACÓRDÃO Nº 466/2022

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